No Islã, nada na criação é acidental. Tudo o que Allah criou possui sabedoria e propósito inclusive aquilo que, à primeira vista, parece ser uma falha ou deficiência. O esquecimento (nisyān) é um desses traços humanos aparentemente frágeis, mas que, sob a luz da revelação, revela-se uma das maiores misericórdias divinas concedidas à criatura humana.
1 O esquecimento como característica inata
O Alcorão relata que Adão esqueceu:
“E fizemos um pacto com Adão antes, mas ele esqueceu, e não o encontramos firme.”(Surat Ṭā-Hā, 20:115)
Allah poderia ter criado o ser humano sem essa capacidade de esquecer, como fez com os anjos. No entanto, ao dotar o homem dessa vulnerabilidade, Ele também abriu a porta para a esperança, o perdão e o recomeço.
2 O esquecimento alivia a dor e o sofrimento
Uma das maiores formas da misericórdia de Allah manifesta-se quando o ser humano é capaz de esquecer aquilo que o feriu. Imagine se os traumas, as perdas, os insultos, as decepções e as dores permanecessem eternamente vívidas na mente a vida se tornaria insuportável.
Assim, Allah fez do tempo e do esquecimento dois bálsamos. O Profeta ﷺ disse:
“Não há aflição que atinja o crente, sem que Allah a use para apagar seus pecados — mesmo que seja uma espinha que o fira.” (Bukhārī, 5641)
Esquecer não apaga apenas da memória, apaga também do coração. E com isso, Allah concede cura.
3 O esquecimento permite o recomeço
Se o ser humano se lembrasse de todos os seus erros, fracassos e pecados com nitidez constante, não encontraria forças para seguir. O esquecimento parcial de nossos próprios deslizes permite que nos levantemos e tentemos de novo, como crianças que aprendem a andar.
O próprio arrependimento (tawbah) é sustentado por essa dinâmica: Allah apaga, e o servo aprende a caminhar novamente.
“Ó Meus servos que transgrediram contra si mesmos! Não desesperem da misericórdia de Allah.” (Surat az-Zumar, 39:53)
Essa misericórdia se manifesta inclusive na capacidade de esquecer um passado obscuro para viver uma nova vida sob a luz da orientação.
4 O esquecimento protege contra o orgulho
Se o ser humano se lembrasse constantemente de todas as suas boas ações, caridade, orações e jejuns, talvez caísse no orgulho e na ostentação espiritual. Allah, por misericórdia, permite que nos esqueçamos de muitos de nossos atos justos e que até nos surpreendamos no Dia do Juízo ao vê-los registrados.
O Profeta ﷺ narrou que Allah dirá no Dia do Juízo:
“Ó filho de Adão, Eu estive doente e tu não Me visitaste.”
O servo dirá: ‘Senhor meu, como eu Te visitaria, sendo Tu o Senhor dos mundos?’
Ele dirá: ‘Meu servo tal estava doente, e tu não o visitaste. Não sabias que, se o tivesses visitado, terias Me encontrado junto dele?’ (Muslim, 2569)
O servo esqueceu, mas Allah não esquece.
5 O Esquecimento É uma Prova de que Allah É Quem Lembra
O esquecimento humano destaca, por contraste, a perfeição do atributo divino de al-Ḥafīẓ o Protetor, o Guardião, Aquele que nunca esquece.
“Teu Senhor não é esquecedor.” (Surat Maryam, 19:64)
Enquanto o ser humano esquece as pessoas, os favores e até a si mesmo, Allah preserva tudo com sabedoria e justiça. Isso cria uma relação de dependência saudável: o servo sabe que sua memória falha, mas que a de seu Senhor é perfeita. Por isso, confia e se entrega.
6 O esquecimento estimula o fhikr
O fato de esquecermos constantemente é um convite permanente à prática do dhikr a lembrança consciente de Allah. Se não houvesse esquecimento, não haveria busca constante.
“Lembra-te do teu Senhor sempre, e não sejas dos negligentes.”
(Surat al-Aʿrāf, 7:205)
A espiritualidade islâmica é construída nesse ritmo: lembrar após esquecer, retornar após se afastar, arrepender-se após cair. É essa repetição que molda os corações sinceros.
O esquecimento como dom velado
Esquecer é doloroso quando queremos lembrar; é bênção quando queremos superar. Em ambos os casos, o Islã nos ensina que o esquecimento não é um erro de design, mas uma manifestação da sabedoria e misericórdia de Allah.
Allah é Quem nos permite esquecer quando isso nos cura.
Allah é Quem nos recorda quando precisamos ser guiados.
E é por meio desse vai-e-vem entre nisyān e dhikr que a alma cresce.
“E se esqueceres, lembra-te do teu Senhor.” (Surat al-Kahf, 18:24)
| Tópico | Explicação | Evidência Islâmica | |
| 1 | Esquecimento como característica inata | Faz parte da criação humana. Adão esqueceu. Não é falha, mas fragilidade com sabedoria. | “Adão esqueceu…” (Ṭā-Hā 20:115) |
| 2 | Alívio da dor e sofrimento | Allah permite que esqueçamos traumas e dores como cura emocional. | “Não há aflição… sem que Allah apague pecados.” (Bukhārī 5641) |
| 3 | Permite o recomeço | Esquecer falhas e pecados antigos possibilita reerguimento e renovação espiritual. | “Não desesperem da misericórdia de Allah.” (az-Zumar 39:53) |
| 4 | Protege contra o orgulho | Esquecer boas ações evita vaidade e ostentação. Surpresa positiva no Dia do Juízo. | “Eu estive doente e tu não Me visitaste…” (Muslim 2569) |
| 5 | Prova de que Allah é Quem Lembra | O esquecimento humano revela o atributo de al-Ḥafīẓ: Allah não esquece nada. | “Teu Senhor não é esquecedor.” (Maryam 19:64) |
| 6 | Estimula o dhikr (lembrança de Allah) | O esquecimento convida à busca constante pela lembrança. Molda a espiritualidade. | “Lembra-te do teu Senhor…” (al-Aʿrāf 7:205) |
| Dom Velado | Esquecer pode ser doloroso ou curador, mas é sempre um traço de misericórdia divina. | “E se esqueceres, lembra-te do teu Senhor.” (al-Kahf 18:24) |
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